O
Yoga pode ser uma excelente forma de combater a ansiedade, uma perturbação cada
vez mais comuns nos nossos dias. No entanto, as aulas de grupo, podem nem
sempre ser as mais indicadas para o fazer.
Ansiedade e aulas de Yoga
Muitas
pessoas que procuram o yoga para lidar com a ansiedade, quando tentam praticar
em grupo, sentem que ficam ainda mais ansiosas. Isto pode acontecer por vários
motivos: por um lado porque a pessoa ansiosa tem tendência para ficar demasiado
presa aos seus pensamentos, receios e julgamentos o que significa que poderá
ter alguma dificuldade em relaxar na aula e deixar-se levar, por ficar com medo
do julgamento dos outros. O facto das aulas, muitas vezes, se fazerem com os
olhos fechados também pode ser difícil porque, por um lado, para estar de olhos
fechados é preciso confiar – coisa que não é muito natural para uma pessoa
ansiosa – por outro, ao mantê-los abertos, vendo todos os outros de olhos
fechados, a pessoa sente logo que está a falhar mesmo numa coisa que parece ser
tão simples. A maior parte das pessoas ansiosas também tem tendência para olhar
à volta e imaginar que todos os outros estão perfeitamente relaxados e que
parecem capazes de fazer imensas coisas que a pessoa não é capaz de fazer e
sentem-se deslocadas e incapazes de descontrair, imaginando que todos estão a
reparar que ela está ali como um peixe fora de água. Se as aulas incluirem
posições difíceis ou exigentes e a pessoa estiver
pouco preparada para isso ainda mais difícil será sentir que todos são capazes
de fazer coisas que ela não consegue e que não deveria estar ali. Se o
professor não fizer questão de salientar que no yoga não há metas, nem
objectivos a atingir e que o corpo é apenas uma ferramenta para chegarmos a
outras partes de nós, então é muito provável que a pessoa ansiosa aborde a
prática da mesma forma que costuma abordar tudo o resto na sua vida: como uma
ferramenta para chegar a um determinado objectivo, neste caso o de se livrar da
ansiedade. E rapidamente começa a sentir que está a falhar nesse objectivo – ao
contrário de todos os outros que lhe parecem irritantemente concentrados e
relaxados ao mesmo tempo que passam com toda a delicadeza, flexibilidade e
destreza de uma posição para a outra. E se o professor não está atento a esta
tendência que as pessoas ansiosas tipicamente têm para atingir objectivos e
para, pelo caminho, irem fazendo comparações e julgamentos, e procura
incentivar os alunos a conseguirem a posição “perfeita” ou a chegarem um pouco
mais longe, ou a relaxarem enquanto põem os pés atrás da cabeça ou se viram de
pernas para o ar, é uma receita mais que certa para que uma pessoa ansiosa
comece a sentir-se ainda mais agitada.
Por
outro lado, muitas vezes nestes quadros, também surge aquilo que se chama
ansiedade provocada pelo relaxamento. Isto acontece quando a pessoa tenta
relaxar e acaba por ficar ainda mais ansiosa e é relativamente frequente em
casos de pessoas que vivem debaixo de um stress crónico e que procuram o yoga
ou a meditação para relaxar. Se o professor não estiver consciente desta
tendência comum é muito natural que a desvalorize ou que diga à pessoa que ela
irá passar ou que simplesmente tem de se esforçar mais para a próxima. Mas, na
verdade, nestes casos, o mais comum é a pessoa fugir o mais depressa possível
da aula sem dizer nada ao professor e nunca mais voltar. Porque nestes casos a
pessoa sente que falhou ou que simplesmente aquela prática não é para si. E
quando se pensava que poderia estar ali a solução para um problema que incomoda
tanto e há tantos anos isto pode ser tão frustrante que a pessoa nem quer falar
disso. Ou porque ficou tão assustada que também não lhe apetece falar sobre o
assunto, principalmente quando nem conhece o professor. Nestes casos este aumento
da intensidade da ansiedade que pode acontecer quando a pessoa começa a tentar
relaxar também pode ter várias causas: por um lado pode ser simplesmente o
facto da pessoa voltar toda a atenção para si que a faz tomar consciência de
algo que sempre esteve presente mas que do qual não se dava conta. Por outro
lado pode haver realmente um aumento da ansiedade provocado pelo facto da
pessoa estar a tentar relaxar. Relaxar significa baixarmos as nossas
defesas e, porque a ansiedade é uma protecção, é como se estivéssemos a viver
permamentemente num sistema de alerta e, quando tentamos relaxar, o sistema
dispara dizendo-nos que não é seguro fazê-lo. Além disso, o relaxamento é um
estado totalmente novo para quem vive constantemente em tensão e, quando a
pessoa, de repente, se sente a relaxar um pouco pode surgir também uma sensação
de que se está a perder o controlo, algo que uma pessoa ansiosa procura evitar
a todo o custo.
Este aumento
da ansiedade também pode vir da luta interna que gerámos ao tentar impor o
relaxamento: quando tentamos controlar um processo que não é controlável, um
processo que podemos apenas permitir que aconteça, gera-se uma tensão tremenda
por não nos sentirmos capazes de impor a nossa vontade e de atingir o tão
esperado objectivo – o relaxamento profundo. O facto deste processo ser algo que não é possível controlar de um ponto de vista racional também pode ser algo que assusta: assim que a pessoa começa a sentir-se relaxar mais um pouco, é como se o seu lado racional sentisse que está a perder o controlo (e, de certo modo, está) e isto pode ser também bastante assustador.
Ansiedade e Yoga Terapia
Se o professor não for capaz de enquadrar estas vivências da pessoa e de lhes dar algum significado é muito provável que a pessoa sinta que praticar yoga não é algo que esteja ao seu alcance ou que seja benéfico para si e que simplesmente desista da prática.
Então,
numa sessão de yoga como terapia, feita como um profissional que possua algum conhecimento destes mecanismo há muito mais espaço para integrar e gerir tudo isto.
Primeiro, porque as sessões são sempre individuais, a prática pode ser muito mais
adaptada às capacidades da pessoa e também desaparece aquela sensação de
que todos conseguem fazer tudo melhor do que nós. Depois, nestes
casos, torna-se muito importante haver também um espaço para falar das
sensações, para as clarificar, para que deixem de se tornar algo tão assustador
que só queremos fugir delas e numa sessão individual, em que se construiu já algum tipo de aproximação com o professor, é muito mais fácil fazê-lo. O facto de não haver mais alunos também significa que a pessoa sente que pode interromper a prática a qualquer momento sem incomodar ninguém, se as sensações se tornarem demasiado intensas. E isto, só por si, também pode ser um importante contributo para uma maior sensação de segurança e conforto.
Nestas sessões é importante também que a pessoa
tenha um espaço para perceber como tudo funciona, para perceber que é
contra-producente lutar contra os seus próprios sentimentos ou para tentar
fugir deles. É importante que a pessoa tenha espaço também para ir
experimentando abdicar desse controlo constante em que julga que precisa de
viver para que, aos poucos, se permita ir relaxando sem medos. Para isto é
muito importante que a pessoa aprenda a confiar no terapeuta que dirige a
prática e que este tenha conhecimento dos mecanismos da ansiedade para que possa ajudar a dar algum significado às vivências do praticante.
Outro
aspecto que difere das aulas de grupo é o facto de, num trabalho que usa o yoga
como terapia, ser fundamental que a pessoa aprenda a desenvolver uma rotina de
prática em casa, para que os efeitos se façam sentir, e que aprenda também a
aplicar os conhecimentos e as vivências que vai obtendo com a prática no seu
dia-a-dia. O papel do yoga terapeuta aqui é o de facilitar a integração dessas
vivências na rotina diária da pessoa e de a orientar na forma como pode
estender essa aprendizagem às várias experiências que vai vivendo.
No
caso de pessoas que sofrem com a ansiedade também pode ser muito útil conjugar
a prática com algum tipo de aconselhamento psicológico que ajude a pessoa a
lidar melhor com a sua ansiedade. Se estas sessões de yoga como terapia forem
conduzidas por um psicólogo, como acontece no Espaço Vida, então as duas coisas
poderão ser facilmente integradas.
Aceitar a Ansiedade
Ao
procurar o yoga como terapia para a ansiedade é essencial que a pessoa saiba
que se torna a responsável pelo seu próprio processo de cura mas que, ao mesmo
tempo, essa cura não passa por lutar com a sua condição. O primeiro passo
fundamental que precisamos de dar para nos libertarmos da ansiedade é a
aceitação dessa mesma ansiedade. Isto pode parecer paradoxal mas a verdade é
que a única forma de nos libertarmos de vez de uma ansiedade crónica começa com
a aceitação da mesma. Porque aceitar essa ansiedade significa que nos estamos a
aceitar a nós mesmos e, sem essa aceitação profunda e verdadeira, nada mais
pode ser realmente eficaz. A ansiedade existe muito provavelmente porque não
encontrámos essa aceitação incondicional – pelo menos não tanto como
precisávamos - nos primeiros anos das nossas vidas, numa altura em que esta era
essencial para crescermos com a segurança e a tranquilidade de saber quem
somos. As crianças criam uma imagem de si de acordo com o que vêem nos olhos
dos seus pais e um adulto ansioso é alguém que não teve um bom espelho enquanto era criança. As pessoas mais ansiosas mais do que aprenderem a ver-se a si mesmas nos olhos dos seus pais, é provável que tenham aprendido antes a ver aquilo que precisavam de
atingir, o que deveriam fazer, o objectivos que precisavam de cumprir. Por
outro lado, uma pessoa ansiosa é também uma pessoa que sente que precisa de se
proteger o tempo todo, porque algo de mau pode vir a acontecer, então isto
significa que faltou também um sentimento de verdadeira protecção na infância
provavelmente porque os pais não estiveram tão presentes quanto a criança
precisava, não por falta de amor, mas porque provavelmente também eles sofriam
de alguma ansiedade, preocupações ou tristezas e era isto que a criança via
reflectido nos seus olhos, em vez de se ver a si mesma. As crianças quando
nascem, e durante os primeiros anos de vida, precisam de uma aceitação incondicional e de
uma presença quase total por parte dos pais e, se não as encontram, é muito provável que cresçam com um
certo sentimento de insegurança e de que há algumas partes de si que não são
dignas de amor. E isto acaba por levar a um estado de ansiedade mais ou menos constante.
Laura Sanches