quinta-feira, 30 de outubro de 2008

o Yoga e as Crianças

Se antigamente havia uma certa tendência para negar que as crianças pudessem sentir pressão ou stress, hoje em dia, há muitos estudos que mostram que um número cada vez maior de crianças sofre de ansiedade ou depressão.

De facto, nos nossos dias as crianças estão sujeitas a níveis cada vez mais elevados de stress e de tensão. As pressões e exigências que se exercem sobre elas são cada vez maiores e sobra cada vez menos tempo para brincar e ser criança. Para além disto, as crianças sofrem também com a vida agitada que leva a maioria dos pais, visto que não só dependem deles fisicamente como emocionalmente também; acabando por ser, de certa forma contagiadas com o stress e a tensão que os pais tantas vezes trazem involuntariamente para casa, pelo seu ritmo de vida agitado e pela falta de tempo que estes muitas vezes têm.

Assim, não é de estranhar que surjam cada vez mais casos de hiperactividade nas crianças, juntamente com uma série de outras perturbações (como depressão, agressividade, dificuldades de aprendizagem, mau comportamento, etc) que parecem ser um reflexo inevitável da forma como hoje em dia o stress faz cada vez mais parte do nosso dia-a-dia.

A ansiedade nas crianças traduz-se de várias formas: dificuldades de aprendizagem (sendo que níveis de ansiedade elevados chegam mesmo a fazer diminuir a pontuação em testes de QI), agressividade, dificuldades na resolução de problemas, comportamentos de dependência excessiva ou de chamadas de atenção constantes, baixa auto-estima, maus relacionamentos com os colegas ou com os professores e vários sintomas físicos que podem surgir em casos de ansiedade crónica, visto que o sistema imunitário fica mais debilitado e que todo o equilíbrio químico e hormonal do nosso organismo é afectado pelos estados de stress. Por vezes as crianças mais quietas, que ficam caladas durante a maior parte do tempo, que participam pouco nas actividades e que, à primeira vista poderiam parecer apenas bem-comportadas, também podem sofrer de altos níveis de ansiedade que se podem manisfestar por comportamentos de apatia e isolamento.

Para além de todos estes sintomas, que podem prejudicar gravemente a vida da criança, também é verdade que uma criança ansiosa terá mais tendências para se tornar um adulto ansioso, perpetuando assim um ciclo de ansiedade e mal-estar que, quanto mais tempo durar, mais difícil será de quebrar. Por isto, iniciar a prática de Yoga na infância pode ser muito benéfico não só para a criança mas também para o adulto que esta virá a ser.

A prática do asana (posições ou posturas) tem vários benefícios do ponto de vista físico mas também psicológico, visto que ao fazê-los se pretende que a criança ganhe uma maior consciência corporal, havendo também uma maior aceitação do corpo levando á criação de uma auto-imagem mais positiva.

Foi demonstrado em alguns estudos que o Yoga pode mesmo dar um contributo significativo para o aumento da aceitação e da satisfação corporal. Também tem sido demonstrado que o Yoga, por contraste com outros programas de desporto, contribui significativamente para diminuir os sintomas de ansiedade nas crianças.

O pranayama (exercícios respiratórios) também tem um efeito muito positivo sobre a ansiedade e a tensão nas crianças, ensinado-as a reconhecer a ligação entre os estados emocionais e a respiração e de que forma podem influenciá-los com simples exercícios de respiração. Como a respiração abdominal, por exemplo, que ajuda a entrar em estados mais profundos de relaxamento e tranquilidade e a que a criança pode recorrer sempre que se encontrar perante situações de tensão na sua vida.

Nas consultas de Psicologia com crianças, por vezes, torna-se muito importante ensinar-lhes algumas técnicas de relaxamento. Assim, nas aulas de Yoga para crianças do Espaço Vida, reconhecendo a importância destas técnicas, procuramos também que estas façam parte de todas as aulas. A aprendizagem de algumas técnicas de relaxamento pode ser uma ferramenta muito útil para toda a vida futura da criança, já que irá ensiná-la a eliminar os efeitos nocivos do stress e dar-lhe-á a segurança de saber que pode enfrentar os desafios que a vida lhe trouxer com maior serenidade, confiança e lucidez.

Os exercícios de meditação ou concentração, são também uma parte importante destas aulas, visto que produzem na criança também um estado de relaxamento profundo, ao mesmo tempo que lhe permitem aprender a direccionar a sua atenção, a melhorar o seu grau de concentração e também a ajudam a saber que poderá estar na vida sempre de uma forma mais tranquila, mais feliz e realizada.

Nas aulas de Yoga para crianças, tudo isto é transmitido de uma forma lúdica, atractiva e adequada a esta faixa etária e ao seu nível de desenvolvimento, o que contribui para que, geralmente, estas adiram muito bem a esta prática.

Iniciar a prática do Yoga na infância é plantar as sementes para que as crianças cresçam como adultos mais felizes, tranquilos, realizados e capazes de conduzir as suas vidas de forma eficiente e preenchedora.
Laura Sanches

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Yoga e Hipertensão arterial


O Yoga pode ser uma prática importante e eficaz no combate à hipertensão arterial, no entanto também é verdade que, alguns dos exercícios feitos vulgarmente nas aulas de Yoga podem também ser prejudiciais para os alunos hipertensos.
Sabemos que esta é uma patologia cada vez mais comum nos nossos dias e, como professores de Yoga, sabemos também que é relativamente comum que pessoas hipertensas venham praticar Yoga. Como tal, torna-se fundamental saber quais serão os asanas e pranayamas desaconselhados para esta condição, bem como as técnicas que poderão ajudar a diminuir a pressão arterial.

O que é a Hipertensão

Em primeiro lugar devemos perceber em que consiste a hipertensão arterial.
Os valores em que pode ser diagnosticada a hipertensão podem variar, mas alguns estudos recentes realizados nos EUA apontam para que, valores superiores a 160/95 mm hg sejam considerados hipertensos, e valores entre 140/90 mm hg e 160/95 mm hg se considerem borderline.

E em que consistem estes valores? O valor mais alto é denominado por pressão arterial sistólica, que acontece quando o coração bombeia, contraindo-se, o sangue oxigenado do ventrículo esquerdo para a artéria aorta. Esta pressão arterial não mantém o mesmo valor ao longo de todo o circuito sanguíneo, uma vez que vai diminuindo gradualmente até o sangue desoxigenado chegar à aurícula direita com a pressão arterial de quase zero.
O coração também pode ser considerado um órgão muscular respiratório, pois participa no processo da respiração, bombeando o sangue que transporta o oxigénio e nutrientes e, depois, recebendo o sangue desoxigenado (com CO2 e impurezas) interagindo directamente com os pulmões.

A seguir à pressão arterial sistólica, a pressão nas artérias diminui quando o coração se volta a encher para a próxima contracção. Este valor mais baixo da pressão arterial é conhecido como pressão arterial diastólica, porque a fase em que o coração está relaxado é conhecido como diástole.

A oscilação das duas pressões é que produz a pulsação arterial, que é transmitida como uma onda de pressão através das paredes das artérias (algumas veias) podendo ser sentida em vários pontos do corpo. Normalmente, a pressão arterial é medida nos pulsos e com o braço à altura do coração porque esta é influenciada pela acção da gravidade, variando consoante a localização e posição de cada parte do corpo em relação ao coração.

A pressão arterial nos vasos, que se encontrem verticalmente abaixo do nível do coração, aumenta por causa da pressão que o sangue exerce nas artérias, devido ao efeito da gravidade. Quanto a uma parte do corpo que se encontre numa posição verticalmente acima do nível do coração, irá verificar-se uma diminuição da pressão arterial pois o sangue terá que contrariar a força gravítica.

Como Aadil refere, as razões que podem conduzir a um estado de hipertensão são variadas, entre elas a dieta, a falta de exercício físico, obesidade, predisposição genética e o stress. Relativamente a esta última, apesar de ainda não existirem estudos que comprovem a 100% esta relação, tudo aponta para que ela exista.

Hipertensão e Yoga


No caso particular do stress e como reacção a este, o Sistema nervoso Simpático origina uma vasoconstrição o que aumenta a pressão arterial. Ensinar às pessoas técnicas de gestão de stress eficientes, pode conduzir a uma redução do stress e a uma diminuição consequente da pressão arterial (McCaffrey et al., 2005) e o yoga, com algumas das suas técnicas, pode desempenhar um papel importante nesta aprendizagem.

Durante o exercício físico numa pessoa saudável o valor da pressão arterial pode subir até 240/160mm hg ou mais sem efeitos negativos, mas em pessoas hipertensas é necessário termos atenção à subida excessiva dos valores da pressão arterial, pois podem trazer consequências nefastas.

Os diferentes tipos de exercício parecem ter efeitos diversos ao nível destas mudanças de pressão arterial. O exercício estático, como o que é realizado em diferentes tipos de yoga, tende a aumentar a pressão distólica mais do que o exercício dinâmico, onde os músculos são contraídos e relaxados de uma forma rítmica, como é o exemplo das sequências de asanas mais exigentes como, por exemplo, o surya namaskar .

Este aumento da pressão distólica pode originar um esforço no coração, reduzindo a circulação sanguínea nas artérias coronárias, nos pequenos vasos sanguíneos que fornecem oxigénio e nutrientes às paredes do coração.

O aumento da pressão arterial durante a sessão é proporcional à exigência da sequência praticada, ou ao esforço para permanecer na posição estática. Esta é a razão pela qual aos hipertensos se desaconselha a prática de tipos demasiado exigentes de yoga, ou permanências demasiado longas nos asanas mais exigentes, em especial aqueles com os braços no ar, pois neste caso a pressão arterial aumenta para se conseguir enviar o sangue oxigenado aos músculos dos braços contrariando a acção da gravidade. Tal como Gilmore refere, já o exercício moderado é altamente recomendado e parece ter efeitos positivos nos valores da pressão arterial.

A prática de yoga e os seus efeitos ao nível da hipertensão tem sido bastante estudada e têm-se registado resultados muito positivos. Aadil realça que os estudos parecem demonstrar que quanto maior o valor da pressão arterial, maior será a sua diminuição através da utilização de algumas técnicas do yoga.

Num estudo efectuado (Telles et Al., 2004) com um grupo de 12 novos praticantes de yoga (asana, pranayama, relaxamento guiado, meditação e kriyas), este mostrou uma diminuição significativa de uma forma voluntária do seu ritmo cardíaco de base, num programa de um mês, comparativamente a um grupo de controlo que não praticou yoga e que não evidenciou nenhuma mudança. Como conclusão os autores desta investigação apontam para que a prática de yoga possa facilitar o condicionamento das respostas viscerais através da autosugestão.

Noutro estudo com a duração de 8 semanas que procurou avaliar o efeito de uma prática regular de asanas e pranayamas na redução do stress, pressão arterial e índice de massa gorda (McCaffrey et al., 2005), concluiu-se que a prática de alguns exercícios do yoga pode diminuir a pressão arterial em pessoas com hipertensão suave ou moderada.

Deve-se no entanto ter em atenção que nem todas as técnicas do yoga devem ser utilizadas em pessoas hipertensas. Também é importante avaliar de que tipo de hipertensão é que a pessoa padece. Cada caso deve ser encarado como um caso único. Aadil acredita que as diferentes causas que conduzem a um quadro de hipertensão arterial merecem um tratamento diferenciado.

Cuidados a ter na elaboração de uma prática com pessoas hipertensas


Na elaboração de uma prática para a hipertensão devemos dar atenção a algumas questões importantes. Damos a seguir algumas indicações importantes para aulas de yoga em grupo, realçando que num contexto de yoga terapia, em sessões individuais, existem muitas variantes que podem ser desenvolvidas e que podem trazer benefícios para a pessoa hipertensa mas que, para nos alongarmos demasiado, não iremos aqui abordar.

Exercícios aconselhados para pessoas hipertensas:

- Exercícios respiratórios – pranayamas não exigentes que prolonguem de uma forma confortável as expirações. Como Farhi refere, a respiração denominada diafragmática, pode trazer benefícios no caso da hipertensão arterial. O músculo do diafragma respiratório actua como um “segundo coração” no que concerne à circulação sanguínea através do seu movimento que ajuda a bombear o sangue arterial e a drenar o sangue venoso. Num estudo efectuado nos EUA verificou-se que 100% dos internados num hospital com problemas cardíacos mostravam ter uma respiração em que usavam só a zona superior dos pulmões, o que pode ser um dado muito importante.

- Deve manter-se sempre uma consciência corporal apurada identificando qualquer problema. Se se mantiverem, uma respiração suave e tranquila e o conforto no asana é natural que a pressão arterial também esteja estável.

- Privilegiar os alongamentos sem nunca forçar (muitas vezes a hipertensão arterial está também associada a hipertensão muscular, por isso a importância de asanas de alongamento, que ajudam a libertar algumas tensões acumuladas no corpo e que, no entanto, devem respeitar alguns princípios (ver secção a evitar).


- Relaxamento - esta técnica traz muitos benefícios para a diminuição da hipertensão (aconselhada a quem tem hipertensão arterial grave.

- Meditação - outra técnica que através de diferentes estudos se tem mostrado muito útil no combate à hipertensão arterial.


Cuidados a ter na elaboração de uma prática para alunos hipertensos:

- Não trazer a cabeça abaixo do diafragma respiratório.

- Não elevar os calcanhares ou os braços acima da cabeça ou evitar permanecer de uma forma prolongada nestas posições.

- Saltar de posição para posição, como se faz em algumas práticas, pode ser contra-indicado.

- Evitar a prática de agnisara ou nauli (Massagem abdominal), já que estes são exercícios que aumentam a pressão intra-abdominal, o que por sua vez aumenta a pressão arterial.

- Evitar pranayamas, como o bhastrikha (hiperventilação), o kapalabhati (expirações rápidas e forçadas) e suspensões da respiração com os pulmões cheios (antar khumbhaka) ou com os pulmões vazios (bahir khumbhaka).

-Mesmo estando medicados e com a tensão arterial controlada, aconselha-se a que haja cuidado em particular nas invertidas e nas retroflexões, como defende Aadil, estas posturas podem criar estados de agitação mental e tremores no praticante.
Os asanas de retroflexão têm tendência para aumentar a pressão arterial se forem muito exigentes. Mas, mesmo quando efectuados de uma forma mais suave, não se deve deixar a cabeça tombar para trás.

- As invertidas também devem ser evitadas, pois aumentam a pressão arterial. As invertidas estáticas podem causar problemas porque aumentam excessivamente a pressão nas câmaras e válvulas do coração, comprometendo ainda mais a circulação coronária.
No entanto, algumas invertidas mais suaves e com apoios, como a que podemos ver na imagem, em casos de hipertensão leve e medicada até podem ser recomendadas (Lasater, 1995).

- Os asanas mais exigentes ao nível muscular, quando mantidos por longos períodos de tempo também são contra-indicados.

- Blackmore refere que os asanas de torção também devem ser efectuados com cuidado e sem permanência, pois estes asanas têm tendência para aumentar a pressão interna.

- Monro recomenda ainda que, em casos de hipertensão grave, se evitem: Surya Namaskar, posturas deitadas, posturas em decúbito ventral, respirações rápidas.


Jorge Ferreira

Bibliografia

Aadil, P. (2007) High Blood Pressure – in Yoga as Medicine - The Yogic Prescription for Health and Healing (Timothy McCall (2007) pag. 359-378 Bantam Books New York

Anna Blackmore (2006) Twists. Yoga Therapy Foundation Course, Yoga Biomedical Trust and the Life Centre


Farhi, Donna, (1996), Breathing Book – Good Health and Vitality Through Essential Breath Work. Owl Books New York

Gilmore, Ruth (2008) Blood Pressure: A guide for yoga teachers and practitioners. Spectrum (Summer)

Lasater, J. (1995) Relax e Renew; Berkeley, California.

Monro, Robin; Nagarathna, Nagendra, (1990) Yoga for Common Ailments; Fireside Books, London

McCaffrey et al., (2005) The Effects of Yoga on Hypertensive Persons in Thailand; Holistic Nursing Pratice, July/August 2005 pag. 173-180

Telles et Al., (2004) An Evaluation of the Ability to Voluntarily Reduce teh Heart Rate after a Month of Yoga Pratice. Integrative Physiological & Behavioural Science, April-June, Vol.39, No. 2, 119-125