O mindfulness é um treino da
atenção que nos ensina a observar sem julgar. Este treino permite-nos por de
parte os comentários, avaliações, julgamentos e análises que a nossa mente faz
constantemente e observar a realidade e a nossa experiência tal como elas são. Isto
permite-nos entrar muito mais em contacto com o nosso corpo e com as nossas
sensações o que, por sua vez, nos permite estar muito mais conscientes das
mensagens que este transmite. Acontece que, no nosso percurso de crescimento
muitas vezes aprendemos a desligar-nos do corpo. Quando educamos as crianças,
muitas vezes, acabamos por lhes transmitir que há determinadas emoções que não
são aceitáveis e isso faz com a que a criança passe a negar determinadas partes
de si. As emoções sentem-se no corpo, por isso, a única forma da criança deixar
de sentir determinadas emoções será passando a ignorar as sensações que estas
despertam no corpo.

Com o passar dos anos este
desligar cria uma sensação de insatisfação, uma espécie de vazio que não sabemos
muito bem como preecher. Porque afastamento do corpo, ao afastar-nos das emoções
negativas, também nos impede de saborear verdadeiramente as positivas e então
vamos passando pela vida sem saber muito bem como apreciá-la em pleno. A
incapacidade de nos ligarmos ao corpo e às emoções também nos impede de fazer
verdadeiras escolhas porque para escolher precisamos de escutar as emoções. As escolhas
mais importantes são sempre feitas com base nas emoções. Na verdade há estudos
que mostram que, em todas as nossas escolhas – mesmo aquelas que pensamos serem
mais racionais – são feitas pelas emoções, o racional aparece depois para justificar uma escolha que já foi feita. Estes estudos usam imagens que são
projectadas de uma forma tão rápida que a pessoa não tem tempo de,
conscientemente, as assimilar. O que se verifica é que, mesmo que a pessoa não
chegue a ter tempo de assimilar essas imagens conscientemente, elas continuam a
influenciar as decisões que a pessoa toma a seguir. Jonathan Haidt, psicólogo americano e investigador no campo da psicologia moral, explica que as emoções aparecem sempre primeiro e estão por trás de todas as nossas escolhas o que fazemos é, depois, arranjar argumentos racionais que ajudem a explicar essas escolhas.
Por outro lado, também acontece que, as pessoas que têm mais dificuldade em estar em contacto com as suas emoções acabam por ter também muita dificuldade em fazer escolhas, por vezes, até das coisas mais simples.
Por outro lado, também acontece que, as pessoas que têm mais dificuldade em estar em contacto com as suas emoções acabam por ter também muita dificuldade em fazer escolhas, por vezes, até das coisas mais simples.
Gabor Maté, um médico canadiaano,
no seu livro “When the body says No” desenvolve a tese de que este desligar do
corpo e das emoções, quando é muito acentuado, acaba por fazer com que se
desenvolvam doenças que podem chegar a ser mesmo graves, como o cancro, por
exemplo. O que este autor diz é que o corpo fala constantemente connosco, por
meio das sensações que transmite, e quando não escutamos as suas mensagens ele
precisa de enviar algumas que sejam mais fortes e então surge a doença. Se passámos
muito tempo a ignorar as mensagens do nosso corpo é mais provável que essas
mensagens se tornem mais urgentes daí que as doenças que acabamos por
desenvolver são formas do corpo se fazer escutar e de nos obrigar a parar. Na verdade,
as pessoas que conseguem ultrapassar com mais sucesso essas doenças, são
justamente aquelas que param mesmo para pensar na vida e que ganham coragem
para fazer as mudanças necessárias quando são confrontadas com o seu diagnóstico.
Aquelas que querem continuar como se nada fosse e preferem continuar a pensar
que está tudo bem – e que, muitas vezes são encaradas como as que estão a lidar
melhor com a doença - mostram as estatísticas que são justamente aquelas
que têm mais recaídas e menores probabilidades de sobrevivência. Justamente porque
se recusam a ouvir o corpo e as suas mensagens.
Então, podemos usar a nossa prática
de mindfulness yoga para aprender a ouvir mais o nosso corpo, para estarmos
mais receptivos e em sintonia com as mensagens que ele nos transmite. Uma das
ferramentas que podemos usar para o fazer é a nossa prática de asana. Quando fazemos
asana (as posturas do yoga), especialmente aqueles que são mais difíceis para nós,
o corpo dá-nos uma série de mensagens: podemos sentir os músculos a alongar ou
a serem fortalecidos, podemos tomar consciência dos músculos que não estão a
ser usados e que podem permanecer totalmente relaxados, podemos aperceber-nos
das tensões desnecessárias que estamos a criar, etc. Mas acontece que, no meio
destas mensagens do corpo, surgem também os pensamentos, as avaliações e os
julgamentos: a nossa mente começa a tecer vários comentários e julgamentos
sobre aquelas sensações dizendo-nos que não somos capazes de as aguentar, ou
que algo de mau vai acontecer se insistirmos, ou que não temos força suficiente,
ou que não somos flexíveis, ou que aquilo é muito difícil para nós,etc. E, a
maioria das vezes, são estas mensagens que nos levam a desfazer um asana, mais
do que uma verdadeira necessidade do nosso corpo. Então, é um exercício
importante de auto-conhecimento aprendermos a ser capazes de distinguir as
mensagens da nossa cabeça, os comentários constantes, das verdadeiras mensagens
do nosso corpo. Quando fazemos um asana podemos ter a intenção de escutar
verdadeiramente o corpo e só sair desse asana quando for o corpo a dizer-nos
que já obteve tudo o que precisa de obter daquele exercício.
Se conseguirmos fazê-lo, o que
nem sempre é fácil, damos mais um passo para criar uma verdadeira intimidade e
aceitação com o corpo e connosco mesmos.
Outras vezes também pode
acontecer o contrário: o corpo está cansado da posição, mas a cabeça diz que é
preciso aguentar porque temos que nos esforçar, porque queremos melhorar ou
porque ainda ninguém desfez, ou porque achamos que precisamos de ir mais longe
na posição e, quando isto acontece, é muito fácil magoarmos-nos. Principalmente
se o fazemos repetidamente, aí podemos mesmo criar lesões crónicas ou até com
alguma gravidade. Nestes casos o exercício de ouvir o nosso corpo e reconhecer
as suas mensagens é também um exercício de aceitação: aceitação dos nossos
limites e aceitação da realidade, do nosso corpo, tal como ele é e não como
gostaríamos que fosse. Esta também é uma aprendizagem essencial porque muitas
vezes passamos uma boa parte da vida a lutar connosco mesmos, a achar que
precisamos de ser diferentes e, só quando largarmos essa luta é que teremos
verdadeiramente espaço para crescer, para sermos felizes e para levarmos uma
vida mais saudável e equilibrada em todos os sentidos.
Laura Sanches
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