No dicionário
podemos encontrar a definição de seita como uma doutrina ou sistema que se
afasta da crença geral ou como um grupo de pessoas que professam uma religião
diversa da geralmente seguida. Hoje em dia esta é uma palavra que é usada,
geralmente, com uma conotação negativa e atribuída a grupos marginais da
sociedade que vivem de uma forma que não é bem aceite ou compreendida pelos
demais.
Neste artigo
vamos usar a palavra seita para definir um certo grupo ou escola que vive
fechada sobre si mesma e é liderada por uma figura de autoridade inquestionável
para os seus membros mas questionável aos olhos de todos os outros que estão
por fora desse grupo.
Necessidade de pertença a um grupo
Todos nós,
enquanto pessoa, temos necessidade de sentir que pertecemos a um grupo. Segundo
Jonathan Haidt, investigador e psicólogo, faz parte do ser humano esta
necessidade de sentir que pertecemos a algo maior do que nós próprios. Segundo
este nós não somos animais solitários, o ser humano, enquanto espécie, evoluiu
como membro de um grupo e, por isso precisamos de nos sentir integrados e
acolhidos para sermos felizes e nos sentirmos seguros e preenchidos. Para este
psicólogo é esse um dos grandes benefícios da religião: dar-nos essa sensação
de que pertecemos a algo maior do que nós mesmos, essa sensação que o nosso eu
individual pode fazer parte de algo maior, mais profundo e mais intenso. É
também isso que nos faz gostar de estar no estádio cheio de gente a torcer pela
mesma equipa, ou num concerto por exemplo. Quando estamos no meio de uma
multidão com objectivos comuns isso faz-nos esquecer temporariamente o nosso eu
pequenino, sozinho e limitado e dá-nos uma sensação de sermos maiores, mais
fortes, mais capazes e mais espaçosos. Por momentos cria-se a sensação de que
somos o grupo todo e esse grupo é algo mais poderoso e intenso do que apenas a
soma de todos os eus individuais que o constituem. Nas sociedades orientais,
que são mais sacralizadas, está mais presente essa dimensão do grupo no dia a
dia das pessoas. No ocidente valorizamos mais o indivíduo que o grupo e isso,
por vezes, pode trazer-nos uma certa sensação de vazio por falta desse
sentimento de pertença.
Todas as
actividades espirituais, como o yoga ou a meditação, podem ajudar-nos a
resgatar esse sentimento que não somos só este eu limitado e fechado dentro
deste corpo. O Yoga e a meditação podem ajudar-nos a expandir as fronteiras do
nosso eu e a viver mais facilmente essa sensação de sermos mais e maiores do
que aquilo que geralmente percepcionamos na nossa vida diária.
Se essas
actividades acontecerem dentro de um grupo com os mesmos objectivos e
interesses essa sensação grupal torna-se ainda mais forte e isto pode ter
consequências positivas na nossa vida. O problema acontece quando esse grupo é
liderado por alguém que não tem os melhores interesses de cada um dos seus
membros em mente. Infelizmente isto é o que acontece em algumas escolas de yoga
hoje em dia.
Efeitos do
Yoga e Meditação
Quando
praticamos yoga ou meditação entramos em contacto com muitas partes de nós que
nos eram desconhecidas até então. Isto quer dizer que descobrimos uma outra
dimensão do nosso eu, da nossa personalidade e, se por um lado isto nos pode
abrir portas para uma existência mais feliz e preenchida também é verdade que
nos pode tornar mais vulneráveis e trazer consigo uma certa sensação de
fragilidade. Quando temos a coragem de nos aventurar dentro de nós mesmos e de
mergulhar nas profundezas da nossa psique nem sempre gostamos daquilo que
encontramos à primeira vista. Pode começar por surgir um sentimento de desorientação:
porque nos deparamos com algo novo, podemos não saber o que fazer com essas
descobertas. Podem também ficar abaladas algumas certezas que julgávamos ter
acerca da vida, de nós mesmos e do mundo e isso pode dar-nos uma sensação de
que estamos perdidos sem saber muito bem o que fazer com esses novos insights
que tivemos e sem uma estrutura que nos permita enquadrá-los.
Podemos também
ficar desiludidos com as descobertas que fazermos acerca de nós mesmos, não
gostando do que encontramos cá dentro quando decidimos olhar para nós
verdadeiramente pela primeira vez. Isto pode trazer consigo um sentimento de
insatisfação, de tristeza ou de zanga.
Por outro
lado, quando praticamos yoga ou meditação podem também surgir sensações
agradáveis que desconhecíamos e que ficamos com vontade de voltar a ter porque
nos mostram que esse vazio que nos trouxe à prática está a ser preenchido e de
que estamos no caminho de algo muito bom e gratificante.
Todas estas
sensações, más ou boas, nos colocam numa certa posição de vulnerabilidade. O
simples facto de nos predispormos a olhar para dentro sem fazer ideia daquilo
que iremos encontrar já nos coloca numa posição um pouco vulnerável. Para olhar
para dentro, verdadeiramente, precisamos de estar disponíveis e abertos para o
que quer que possa surgir. Então torna-se importante que sejamos capazes de
confiar na pessoa que está a dirigir a prática, confiar no seu conhecimento
técnico mas e, acima de tudo, nas suas boas intenções, confiar que não está ali
para nos julgar, avaliar, que não está ali para nos manipular, que está a
dirigir a prática com o nosso bem-estar em mente e não o seu próprio bem. Esta
confiança não significa que precisemos de acreditar que aquela pessoa é, de
algum modo, superior a nós. Não precisamos de acreditar que é mais ou melhor
que nós, precisamos de acreditar simplesmente que aquela pessoa tem algum
conhecimento sobre a prática que está a orientar, sobre os seus efeitos nos
alunos e que tem o nosso bem-estar em mente quando está a dirigi-la.
Efeitos da
prática e relação com o professor que a conduz
Mas, acontece
que quando descobrimos que uma prática de yoga ou de meditação pode ter efeitos
tão profundos sobre nós torna-se muito fácil passarmos a associar esses efeitos
à pessoa que dirige a prática, à pessoa que nos apresentou a essa prática. Por
outro lado, um professor de yoga – dentro da aula – geralmente serve como uma
espécie de modelo de algo que queremos conquistar: se vamos para o yoga à
procura de uma sensação de paz e de bem-estar é muito natural que achemos que
aquele professor tem toda essa paz que procuramos, se vamos à procura de
auto-conhecimento é natural que também pensemos que aquele professor já fez
esse percurso. Há sempre uma tendência do aluno para achar que o professor tem
todas as respostas que este gostaria de obter e que já fez todo o percurso que
este gostaria de fazer.
Até certo
ponto é perfeitamente natural e desejável até que assim seja. Quanto mais
confiarmos na pessoa que está a dirigir a prática mais nos entregamos à prática
e mais benefícios acabamos por obter. Só confiando nas boas intenções da pessoa
que dirige a prática é que podemos abrir-nos totalmente a esta e aos seus
efeitos. Então um professor em quem confiamos é como uma mãe em que o filho
confia para explorar o mundo: quanto mais a criança confia na presença da mãe
mais liberdade tem para explorar o mundo e tudo o que o rodeia. Se confiarmos
no professor podemos abrir-nos mais a nós mesmos para explorar tudo o que for
surgindo cá dentro.
Também pode
ser positivo que o professor sirva como uma fonte de inspiração, como modelo de
alguns comportamentos que gostaríamos de adoptar, como forma de vermos que é
possível viver de modo diferente e relacionarmo-nos com outro modo com o que
nos rodeia. Isto pode ajudar-nos a perceber que é possível mudar certos
comportamentos em nós.
Mas, esta
confiança que deve existir dentro da sala de aula, não significa que devemos
perder a nossa capacidade de ver aquele professor - sobretudo quando está fora
da sala - como apenas um ser humano que está a seguir o seu caminho pessoal,
com todos os defeitos e qualidades que todos nós temos. Não significa que
tenhamos que idealizar a imagem dessa pessoa.
Quando essa
idealização acontece significa que passamos a colocar aquela pessoa num
pedestal e isto, só por si, faz com que ela passe a ter a possibilidade de
exercer algum poder sobre nós, uma vez que passa a ser vista como alguém que
possui um conhecimento superior sobre a vida e sobre o mundo e que, por isso
mesmo, está como que num nível superior de evolução. Nestes casos é necessário
que o professor saiba estabelecer barreiras e que deixe bem definidos os
limites da relação mostrando que está ali para ensinar yoga e não para guiar o
aluno em escolhas ou opções pessoais, nem para orientar a sua vida.
Spiritual
Bypassing – Evitamento espiritual
O que acontece
muitas vezes é que o professor também tem algumas lacunas na sua personalidade
e, de certo modo, sentir-se o guia de alguém ajuda a preenchê-las. Assim, se o
professor resolve embarcar na fantasia do aluno de que sabe mais do ele sobre a
vida e as pessoas ou de que se encontra num outro nível mais elevado estão
criadas as condições para esta deixe de ser uma relação positiva, quer para um
quer para outro.
Isto pode não
trazer consequências graves se o professor não tiver más intenções. Em muitos
destes casos o que acontece é que tanto o aluno como o professor ficam
convencidos que estão a fazer um trabalho muito profundo quando, na verdade
estão a fazer aquilo que a que Robert Augustus, chama Spiritual Bypassing – que
podemos traduzir como evitamento espiritual – nestes casos a prática
espiritual, em vez de nos ajudar a crescer e de proporcionar um verdadeiro
autoconhecimento, serve apenas como uma fuga das emoções difíceis. Muitas
pessoas usam a meditação e o yoga como usariam uma droga: para não terem que
lidar com determinadas partes de si mesmas que de não gostam ou que têm medo de
enfrentar. Nestes casos tanto o professor como aluno embarcam neste evitamento
espiritual que acaba apenas por fortalecer cada vez mais as suas defesas e
tornar cada vez mais difícil um verdadeiro crescimento.
Os líderes
psicopatas
Mas, nos casos
em que o professor não tem a melhor das intenções então podem surgir situações
de grande sofrimento para os alunos envolvidos. É o que acontece nas seitas
que, infelizmente, não são assim tão raras no mundo do yoga. Nestes casos
existe um líder que tem quase sempre algumas características específicas que
podem ser consideradas como traços de um psicopata: a falta de empatia, a falta
de preocupação com os sentimentos dos outros, a motivação para atingir os seus
próprios objectivos que normalmente estão ligados à obtenção de uma posição de
poder, a capacidade de manipular e mentir apenas para satisfazer os seus
interesses, a visão de que as pessoas são simples objectos que podem ser
manipulados e usados para conquistar os seus objectivos e satisfação pessoal.
Quando se
junta uma personalidade deste tipo com alunos que procuram este sentimento de
pertença a um grupo (como quase todos procuramos), com uma prática que
naturalmente derruba fronteiras, que pode criar alguma vulnerabilidade, com os
elementos que já referimos está criada a receita para algumas situações que
podem ser muitos dolorosas para os que se deixam apanhar nelas. Infelizmente
isto não é assim tão raro no mundo do yoga e, em países como os E.U.A até já
deu origem a alguns processos judiciais, em que os alunos procuram que os
líderes os compensem através da justiça por todos os prejuízos que causaram.
Em
Portugal também não são assim tão raros os casos de professores que não têm as
melhores motivações e usam o seu poder sobre os alunos para os manipular e para
atingir os seus objectivos sem qualquer consideração pelos seus sentimentos ou
pelo que será melhor para ele. Infelizmente temos também exemplos no mundo do
yoga de professores que usam a sua influência para se insinuarem sexualmente
junto das suas alunas e/ou para conseguirem que os alunos lhes deêm cada vez
mais dinheiro, influência e poder.
Características das seitas
Existem algumas características
que são comuns a organizações do tipo das seitas:
Existência de uma figura de
liderança inquestionável – este, geralmente é algúem que não se pode questionar
e de quem nem se pode falar a não ser que seja para tecer elogios e louvores mas
que está omnipresente em todas as actividades da escola. Jonathan Haidt explica
que sempre que algo se torna sagrado deixa de ser possível questioná-lo. Isto
acontece em todas as sociedades com determinados aspectos que - normalmente
estão associados a rituais religiosos - que são repetidos pelas pessoas sem que
estas saibam já porque os fazem. O seu carácter sagrado, impede-as de pensar
abertamente e de uma forma racional sobre estes comportamentos que assim são
perpetuados e repetidos sem que ninguém os ponha em causa. O mesmo acontece
neste tipo de escolas ou seitas em que a figura do professor já tem esse
carácter sagrado e por isso este pode ter todo o tipo de comportamento – mesmo
os mais absurdos – sem que os alunos cheguem alguma vez a questionar a sua
pessoa. Estou-me a lembrar do exemplo de um suposto mestre que conheci há uns
anos que - entre muitos outros comportamentos duvidosos e sem escrupúlos que
eram feitos às escondidas – tinha uma dependência conhecida abertamente de
coca-cola, sendo capaz de beber várias latas por dia. Este era um comportamento
conhecido de todos e que não será muito próprio de alguém que pretendia passar
uma imagem de quem se precupava com a sua saúde e dos outros e seria sem dúvida
recriminado se fosse de outra pessoa qualquer: o facto daquela pessoa, naquele
meio, ter este estatuto sagrado fazia com nunca se questionassem os seus
comportamentos por mais absurdos que estes fossem.
Posições hierárquicas bem definidas
– existem normalmente regras rígidas associadas à hierarquia como por exemplo,
o uso de um código de cores que permita distinguir os professores mais antigos
dos mais novos e os professores dos alunos ou a imposição de regras para o
lugar que os alunos ocupam dentro da sala de prática, distinguindo os mais
novos dos mais antigos (ou adiantados como por vezes se chamam). Qualquer
instituição que pretenda ter algum tipo de autoridade sobre os outros precisa
sempre de ter estatutos hierárquicos muito bem definidos para que possa fazer
valer essa autoridade. Este tipo de hierarquia leva as pessoas com o estatuto
mais baixo a ambicionarem estar entre os mais altos e a sentir que precisam de
cumprir as regras do grupo para lá chegarem tornando-as tanto mais submissas
quanto maior for o seu desejo de subir na hierarquia e de agradar ao líder. Por
vezes acontece que esse líder abre excepções na hierarquia para as pessoas que
considera “especiais” e que podem passar a ter um estatuto mais elevado mesmo
sem cumprirem os requisitos iniciais todos. Este jogo de poderes, que nunca é
feito às claras, cria alguma insegurança nos membros do grupo, insegurança essa
que, mais uma vez acaba por levar a um comportamento de maior submissão e a um
forte desejo de agradar ao líder.
Segredos – nestas escolas há
sempre a ideia de que os alunos ou professores de estatuto superior têm
conhecimentos importantes sobre a prática que não podem ser transmitidos a
qualquer pessoa. É também propagada a ideia de que o líder da escola tem um
conhecimento profundo acerca da vida e do universo, que poderá mudar a vida de
quem o partilhar, que só poderá ser divulgado a pessoas da sua mais profunda
confiança. Neste tipo de escola está quase sempre latente a ideia de que o
aluno tem que mostrar ser digno de conhecer esses segredos e o líder tem que
reconhecer que este merece conhecê-los. Isto abre portas a que o aluno – na
esperança de obter respostas de que julga precisar para ser mais feliz e poder
levar uma vida mais realizada – se torne vulnerável a todo o tipo de
manipulação por parte do líder. Em muitos casos isto é usado para conseguir até
estabelecer relações sexuais com as alunas (na maioria dos casos em que isto
acontece são líderes homens que assediam as alunas) usando vários argumentos e
formas de manipulação bem descritas no livro “Sex and the Spiritual Teacher” de
Scott Edelstein.
Crítica às restantes escolas - Neste tipo de escola costuma ser veiculada a
ideia de que todos os outros estão errados ou não sabem nada e de que só aquela
escola é que ensina o verdadeiro yoga. Uma das melhores formas de prender os
alunos a determinada escola é fazê-los acreditar que, saindo dela, nunca mais
vão poder aprender nada que valha realmente a pena porque só ali é que se
encontra o conhecimento verdadeiro. São usadas até à exaustão palavras como:
único, mais completo, primordial, ancestral, excelência, etc. Juntamente com as
críticas que vão sendo veiculadas de forma directa ou indirecta acerca das
outras escolas há também a tendência para exagerar muito (por vezes até ao
ponto do rídiculo) as suas próprias características, como algumas escolas que
dizem ter cursos de formação de 6500 horas de aulas efectivas para formar
instrutores de yoga em 6 anos o que implicaria que os alunos estivessem em formação cerca de 3 horas por dia, todos os dias do ano, quando esses cursos acontecem apenas um dia por mês em 10 ou 11 meses do ano.
A noção de ancestralidade – numa
escola deste género o líder quer ser visto como alguém todo poderoso e único
detentor do conhecimento por isso nunca há uma honestidade acerca das formas
como este foi obtido. É muitas vezes veiculada a ideia de que este é um
conhecimento muito antigo que foi captado de uma forma quase sobrenatural. Esta
ideia faz com os alunos sintam que esse conhecimento é algo de inatingível a
menos que seja transmitido pelo grande líder e, ao mesmo tempo, também ajuda a
cimentar ainda mais o seu carácter sagrado e inquestionável.
Inimigo comum – nestas escolas,
sobretudo nos seus círculos mais internos, é muito comum ser incutida uma
espécie de ódio contra uma ou mais escolas concorrentes. Esta escola muitas
vezes é justamente a escola onde esse líder teve os seus primeiros contactos
com o yoga e onde aprendeu muito daquilo que usa. Uma das melhores formas de
fortalecer o espirito de grupo é a criação de um inimigo comum do qual todos
precisam de se proteger.
Regras rígidas e bem definidas
–não convém que o aluno pense muito por si mesmo e que tenha demasiada
liberdade para questionar o que está estabelecido. Costumam existir muitas
regras em relação a vários aspectos da prática mas também da vida e
comportamento do aluno. Muitas vezes estas regras abrangem até os livros que o
aluno pode ler sendo-lhe dada uma bibliografia da qual não é suposto fugir.
Estas regras podem abranger também as normas de conduta dos membros do grupo entre
si e com o líder e podem até ser feitas insinuações sobre a forma como se deve
comportar com amigos e família mesmo fora da escola. Estas regras, como tudo o
resto, servem para que seja mais fácil controlar os alunos e manter bem
estabelecida a hierarquia.
Elogios e ralhetes desmesurados –
os líderes deste tipo de escola, normalmente, são peritos em manipular as
pessoas e em conhecer os seus pontos fracos. Tentativas de exortação que
alternam por vezes com outras de humilhação em público são muito usadas pelas
seitas, com a desculpa de que a pessoa precisa de aprender a por de lado o seu
ego e são uma forma de manter a pessoa dependente, submissa e a cumprir todas
as regras do grupo.
Implicações de pertencer a uma
seita
Estar numa
escola deste tipo pode trazer alguns benefícios como o conforto de sentir que
estamos integrados num grupo aparentemente unido e com ideais comuns. O
problema é que, quase sempre, chega uma altura em que os prejuízos ultrapassam
os benefícios: normalmente nessas escolas os alunos são encorajados a passar
cada vez menos tempo com a família e os amigos fora do grupo. Porque, quase
sempre, para quem está de fora as coisas são muito mais claras estes também
podem começar a fazer comentários e afirmações acerca da escola ou do seu líder
que os membros da seita levam a mal e que fazem com que sintam incompreendidos
e até rejeitados. Assim, se o aluno passar ainda muito tempo envolvido na seita
começa a ficar cada vez mais afastado do mundo exterior o que, por um lado,
acentua cada vez o seu envolvimento com a seita e faz com que questione cada
vez menos tudo o que se passa lá dentro e, por um outro, com que seja cada vez
mais díficil sair dela. As seitas deste tipo acabam por criar uma dependência
no aluno que sente que, se sair dela, estará sozinho no mundo uma vez que
praticamente cortou os laços com todas as relações que tinha anteriormente.
O sentimento
de família e pertença que se cria em grupos destes é, quase sempre, não muito
verdadeiro porque os membros não podem ter relações verdadeiras de amizade
entre si, o que poria em prática todas as estratégias de manipulação do líder
que, muitas vezes, passam justamente por por uns contra outros para se ter mais
poder sobre cada um individualmente. Como nunca é muito claro de que forma é
que alguns membros conquistaram os privilégios que têm também se gera
facilmente um clima de invejas e de insatisfação entre os membros que querem
sempre fazer parte desse grupo mais pequeno dentro do grupo de priveligiados.
No
ínicio da prática é natural que o aluno se sinta bem com as aulas e goste
daquilo que faz, afinal de contas, como já dissemos, o yoga pode trazer efeitos
de bem-estar muito agradáveis a quem pratica. Mas, a verdade é que, nestas
escolas, normalmente o conhecimento de yoga não é muito porque o seu líder está
mais preocupado em obter benefícios pessoais do que em estudar e porque os
alunos e restantes professores não têm liberdade suficiente para conhecer
outras escolas e nem sequer para ler muitos livros, o conhecimento que têm de
yoga acaba por ser muito limitado. No yoga, como em tudo o resto que se queira
estudar e conhecer, é preciso liberdade para experimentar, para ler, para
procurar, fazer aulas, cursos e workshops com professores diferentes e, se
estes forem também de escolas diferentes tanto melhor porque conhecer
diferentes visões sobre aquilo que se estuda é sempre enriquecedor e
importante. Mas, nestas escolas isso não é possível e, por isso os seus
professores acabam por não ter sequer grande conhecimento daquilo que estão a
ensinar.
Isto
tem duas consequências importantes: por um lado é a saúde dos seus alunos que
muitas vezes é colocada em risco com determinados exercícios que podem não ser
adequados a determinadas condições de saúde. Muitas vezes nestas práticas os
professores querem fazer aulas exigentes do ponto de vista físico, porque
sentem que essa será uma forma de mostrar que sabem mas, como não têm
conhecimentos suficientes para lidar com as fragilidades ou desequilíbrios dos
alunos ou simplesmente porque não compreendem bem o efeito dos exercícios que
estão a pedir-lhes para fazer, acabam por surgir lesões que podem ser mais ou
menos graves e ter algumas consequências nefastas. Por outro lado, esta
limitação também acaba por ser sentida pelos professores mais dedicados que,
naturalmente teriam vontade de estudar e de conhecer mais a fundo aquilo que
ensinam mas sentem que não o podem fazer sem entrar em contradição com a escola
e assim acabam por viver este conflito que não é muito benéfico.
Outro
dos efeitos negativos destas escolas é justamente o de abalar a confiança que a
pessoa tem em si própria: quando alguém está numa destas escolas e passou anos
a dizer a si mesmo que determinados comportamentos (como os abraços excessivos
do líder, ou o facto de passar horas fechado na sua sala com algumas alunas, ou
os elogios excessivos a determinados membros do grupo, ou os preços
escandalosos que cobra pelas suas actividades, ou o carro de corrida topo de
gama escandaloso em que anda todos os dias, etc) são normais e naturais e a
tentar rebater todos os comentários que ouvia de familiares e amigos que
estavam de fora e finalmente percebe que todos tinham razão e que afinal nada
disso era normal a pessoa acaba por passar por uma fase de desilusão, de
humilhação (por não ter visto o que os outros viam) mas também, mais grave de
tudo, de falta de confiança em si mesma: porque durante tantos anos não
acreditou nos seus próprios olhos.

O
envolvimento com este tipo de escola faz sempre com a pessoa passe a estar numa
posição de fragilidade e de vulnerabilidade que, quanto mais o tempo passa,
mais rouba a sua confiança em si mesma, a sua autonomia, a sua capacidade de
fazer escolhas e de levar uma vida verdadeiramente feliz, preenchida e
realizada.
Laura Sanches
Se quiser ler mais sobre este tema recomendo os seguintes
artigos:
E os livros:
Sex and the
Spiritual Teacher – Scott Edelstein
Spiritual
Bypassing: When spirituality disconnects us from what Really Matters – Robert
Augustus Masters
1 comentário:
Gostei do seu blog, recente conheci um Templo Budista em Sintra. Não sei se interessa em conhecer mas é muito interessante - http://www.aprenderameditar.org.pt/
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