segunda-feira, 30 de junho de 2008

Efeitos Estudados da Meditação



Para falarmos de meditação e compreendermos os seus efeitos ao nível psicológico é útil dividirmos as várias técnicas que existem em dois grupos: técnicas de concentração e de insight. Esta categorização, como todas, tem as suas limitações, mas é útil para percebermos os diferentes efeitos da meditação ao nível da consciência.

Técnicas de concentração – são todas as técnicas que envolvem a concentração num ponto, tentando afastar todos os outros objectos da consciência. Estas conduzem a um estreitamento da consciência que se foca exclusivamente num único objecto.

Técnicas de Insight – implicam uma atenção constante, mas sem julgamentos, a todos os conteúdos que vão surgindo na consciência. O objectivo é ter uma percepção ampla de todos os conteúdos da consciência, sem que haja nenhum envolvimento com estes. Estas técnicas conduzem a uma expansão da consciência, que se torna capaz de abarcar um número cada vez maior de objectos em simultâneo.

Estas duas estratégias são muito diferentes uma da outra, por isso, é de esperar que produzam também resultados diferentes. E, de facto, há algumas investigações que parecem comprovar esta hipótese.

Quando se entra num estado de meditação, geralmente, a leitura do EEG revela que começam a produzir-se ondas cerebrais do tipo alfa (8 a 13 ciclos por segundo), o que acontece também quando se está num estado de relaxamento profundo. Mas, se entretanto se produzir algum estímulo súbito (como um ruído ou um flash luminoso), esse estado de relaxamento será interrompido e as ondas alfa deixarão de ser produzidas durante alguns segundos, até que a pessoa volte a relaxar. No entanto, se esse estímulo for produzido de forma constante, dá-se um processo de habituação e a produção de ondas alfa deixa de ser interrompida. É o mesmo fenómeno que ocorre quando entramos num local onde cheira mal: no ínicio é díficil suportar o cheiro mas, com a permanência nesse sítio, dá-se uma habituação e deixamos de o sentir.

A primeira investigação foi feita por Kasamatsu e Hirai (in West, 1987), com monges que praticavam meditação Zen, do tipo insight. Foi verificado que, quando estes monges estavam em meditação, não se dava a interrupção das ondas alfa. O que significa que a tal habituação, com eles, nunca acontecia. Estavam permanentemente atentos a todos os estímulos e reagiam a cada um como se fosse o primeiro. Estes monges diziam que percebiam os estímulos de forma até mais clara do que no seu estado normal mas que não eram afectados por eles.

O segundo estudo importante para a compreensão dos efeitos da meditação foi feito por Anand Chinna e Singh (in West, 1987), com praticantes de meditação do Yoga, usando uma técnica de concentração. Estes reagiram de forma muito diferente dos anteriores: não mostravam qualquer reacção nem ao primeiro estímulo. Como se nunca os tivessem ouvido. Durante a meditação conseguiam-se isolar totalmente do ambiente exterior. Mas, quando não estavam a meditar, também não mostravam qualquer habituação; mantinham a mesma frescura de percepção que tinham os monges Zen. Podemos dizer que estes praticantes de meditação viam o mundo com olhos sempre frescos, como se tudo fosse novo, sem se deixarem contaminar por hábitos de percepção, que acontecem de forma inconsciente na maioria das pessoas e que, muitas vezes, nos levam a reagir de forma precipitada e com base em condicionamentos inconscientes. A maioria das pessoas intepreta os acontecimentos com base em experiências anteriores, mas estes resultados levam-nos a pensar que o mesmo não acontecerá com estes praticantes, que parecem reagir sempre a todas as situações com uma atitude de disponibilidade e abertura perante cada acontecimento.

Mais tarde houve quem tentasse replicar estes dois estudos sem obter os mesmos resultados. No entanto, estes continuam a ser um marco, sendo frequentemente citados, no que respeita aos efeitos da meditação.

E os efeitos da meditação são de facto muitos, não só que diz respeito ao funcionamento cerebral mas também ao nível da nossa percepção e compreensão do mundo. De facto, a meditação parece interferir com e alterar toda a nossa forma de percepcionar o mundo. Há um estudo interessante que o demonstra. Este é descrito por Roger Walsh (1993) e foi feito com um grupo de praticantes de meditação budista, usando o teste de Rorschach. Este teste é composto por uma série de pranchas com manchas de tinta, que são apresentadas à pessoa. Parte-se então do princípio que, o ser humano, perante a angústia que lhe causaria estar perante algo sem sentido, terá imediatamente a tendência para atribuir um significado às manchas. A forma como cada um de nós dá sentidos diferentes a cada uma das manchas foi estudada e analisada e a partir das diferentes formas de organizar as manchas que cada indivíduo usará, o psicólogo poderá então fazer a sua interpretação acerca da personalidade deste e do seu modo de funcionamento.

No caso destes praticantes de meditação budista, o que se verificou foi que, os que eram apenas iniciantes, tinham padrões de resposta normais, iguais aos de quem não medita. Mas os mais avançados tinham muito pouca tendência para elaborar o que viam. Walsh diz-nos que a meditação foca a mente e reduz o número de associações, interrompendo assim esse processo que é geralmente automático e inconsciente em todos nós. Estes resultados confirmam também a hipótese anterior de que a meditação parece libertar-nos dos condicionamentos associados à forma como percepcionamos o mundo.

Mas, dentro destes praticantes mais adiantados, havia ainda algumas diferenças, de acordo com os estágios em que cada um estava. Os budistas distinguem vários estágios, de acordo com a experiência e a capacidade que cada um tem de dominar as técnicas de meditação.

Assim, aqueles que estavam no que era considerado por eles e pelos seus mestres a fase inicial de iluminação, que tinham tido experiências iniciais de nirvana, viam as imagens como criações das suas mentes e tinham noção do processo, momento a momento, em que o seu fio de consciência se tinha transformado em imagens organizadas. Estas pessoas mostravam conflitos normais à volta de temas como a dependência, sexualidade e agressão, contudo apresentavam muito poucos mecanismos de defesa e muito pouca reactividade a estes conflitos. Pareciam ser capazes de conviver com estes conflitos psicológicos, que são normais nas outras pessoas (mas que costumam provocar algum sofrimento), sem se deixarem afectar por eles, sem reagir a estes. Pareciam ser capazes de se aceitar melhor a si próprios e às suas dores do que a maioria das pessoas comuns. Isto, aliás vai de encontro à filosofia budista que nos ensina que uma das causas para o sofrimento é justamente o não sermos capazes de aceitar a nossa experiência presente, mesmo que esta implique alguma dor.

Com os poucos praticantes que tinham já bem mais de 20 anos de experiência e estavam na 3ª fase de iluminação, já com o estatuto de mestres, as respostas foram mesmo únicas: estes viram não só as imagens mas a própria mancha como uma projeccção da mente; não mostraram evidências de conflitos internos e pareciam mesmo livres de conflitos; ligaram sistematicamente as respostas de todos os 10 cartões numa resposta integrada com um único tema, o que é algo extremamente raro e indicativo de capacidades criativas e elaborativas muito acima da média. O resultado foi um ensinamento sistemático acerca da natureza do sofrimento humano e do seu alívio. Diz Walsh que os mestres de meditação transformaram o teste do Rorschach num ensinamento para os examinadores.

Ao que parece, vendo estes resultados, a seguir à aceitação vem mesmo a libertação do sofrimento, tal como foi já explicado por Buda.

Ao nível fisiológico e neurológico há também inúmeros estudos que comprovam os efeitos da meditação:
1. Diminuição dos batimentos cardíacos e da tensão arterial, alterações ao nível da química sanguínea com alterações hormonais e diminuição do colesterol.

2. Abrandamento do EEG, que passa a registar ondas alfa e, em alguns casos de praticantes mais avançados, ondas teta (4 a 7ciclos por segundo) que, geralmente, aparecem apenas em estados de sono profundo).

3. Maior sincronização ou coerência entre diferentes áreas corticais, o que significa que há mais áreas do cérebro activas ao mesmo tempo. Alguns investigadores sugerem que isto produz uma base para uma maior criatividade e crescimento psicológico. Mas esta coerência também pode ocorrer na esquizofrenia e a na epilepsia, pelo que não há certezas acerca do seu significado.

4. A meditação pode reduzir a actividade do hemisfério esquerdo, que está relacionada com a análise verbal. Pode acontecer uma redução da actividade deste hemisfério ou uma maior activação do direito. Há algumas evidências de uma maior actividade do hemisfério direito em praticantes de meditação, como capacidade de recordar e descriminar tons musicais. Mas parece que o esquerdo não é desactivado, por isso ficam ambos activos.

5. A meditação também parece estar relacionada com um aumento do fluxo sanguíneo do cérebro, com um aumento do fluxo nas 3 superfícies do lobo frontal e no tálamo.

6. Um estudo anatómico descrito por Chris Mace (2008) feito com praticantes de meditação com um mínimo de 2 anos e uma média de 9 anos de prática, comparou os córtexes de 20 praticantes de meditação com 15 não praticantes. Verificou-se que estes eram significativamente mais espessos em muitas áreas, nos dois hemisférios, mas não eram mais espessos que os do controlo, no geral. Havia diferenças claras no córtex pré-frontal nos dois lados e à volta da insula direita. Quanto mais velho era o sujeito maior era a diferença, sugerindo que a meditação poderia estar a prevenir um processo que ocorreria naturalmente com a idade, em que o cérebro se tornaria progressivamente mais fino. Este estudo tem sido tomado como evidência de que o tipo de atenção que se desenvolve na meditação provoca um crescimento neuronal em áreas do cérebro que é provável que sejam activadas durante a meditação.

7. Daniel Goleman (1996) verificou que os praticantes de meditação, numa situação de stress, tinham uma configuração psiscofiosiológica que sugeria uma maior prontidão motora para responder, uma maior activação na antecipação do stressor, mas uma mais rápida inibição limbica na recuperação do confronto, acompanhada por um afecto mais positivo e uma ansiedade situacional mais baixa durante toda a situação.
Assim, conclui que a meditação pode ajudar em situações de stress porque ajuda a uma recuperação mais rápida do ponto de vista fisiológico e psicológico.
-Ao nível psicológico a meditação também proporciona: um aumento da criatividade; mais sensibilidade na percepção, maior capacidade de sentir empatia, sonhos lúcidos, maior capacidade de auto-actualização, uma sensação positiva de auto-controlo e maior satisfação matrimonial.

- Muitas pesquisas sugerem que a meditação pode ser terapêutica para várias perturbações psicológicas: ansiedade, fobias, stress pós-traumático, tensão muscular, insónia, e depressão minor. A meditação regular reduz o uso de drogas legais e ilegais e ajuda prisioneiros a reduzir a ansiedade, a agressividade e as reeincidências.
Para os psicólogos, a meditação também aumenta a capacidade de sentir empatia para com o cliente bem como a disponibilidade para estar presente na relação.
Um estudo de Leo Matos (1987), revelou ainda que a meditação pode ser uma importante ferramenta na recuperação de toxicodependentes.
Laura Sanches

BIBLIOGRAFIA

Scotton, B., Chinen, A., e Battista, J. (1996), Textbook of Transpersonal Psychiatry and Psychology. Basic Books.

Mace, C. (2008), Mindful and Mental Health. Routledge.Matos, L. (1987), Drogas ou Meditação: Meditação como alternativa para o uso de drogas. Vozes.

Walsh, R. e Vaughan, F. (1993), Paths Beyond Ego. The Transpersonal Vision. Tarcher Putnam.

West, M. (1987), The Psychology of Meditation. Oxford Science Publications.

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