sexta-feira, 20 de junho de 2008

Psicologia Transpessoal: entre a ciência e o espírito

O que é a Psicologia Transpessoal?

O termo transpessoal significa para além da persona, palavra que, em grego, era usada para designar a máscara que os actores usavam no teatro. Se a máscara é a nossa personalidade, o transpessoal procura ver para além desta. Com Freud ficou clara a ideia de que o nosso eu é composto por mais do que as partes de que estamos conscientes. Freud analisou e definiu tudo aquilo que estava por trás do nosso consciente, o transpessoal procura definir o que está para além dele. Assim, se Freud catalogou e afirmou a importância do nosso inconsciente, a Psicologia Transpessoal, sem negar esta importância, vem realçar a existência de outros níveis da nossa consciência, igualmente importantes e a que alguns autores, como Sri Aurobindo, por exemplo, chamam o Superconsciente.

O transpessoal enquanto movimento não se restringe apenas à psicologia, pode ser encontrado em várias áreas de estudo, como a sociologia, a antropologia, a psiquiatria, etc. No que se refere à Psicologia este movimento procura estudar as características, consequências e efeitos das experiências transpessoais. Estas experiências são alturas em que, temporariamente, a nossa consciência de sermos uma identidade isolada e independente desaparece e há uma sensação de união a um todo. Durante estas experiências, as pessoas que as relatam, entram em contacto com partes do seu ser que parecem estar para além do ego. Como ego podemos entender a nossa personalidade, aquela com que nos identificamos no dia-a-dia, que nos permite ver-mo-nos como seres distintintos, individuais, com uma existência clara e definida no espaço e no tempo. Durante as experiências transpessoais estas fronteiras individuais são, geralmente, dissolvidas e as barreiras do espaço e do tempo que nos isolam do exterior são transcendidas, dando lugar a uma nova percepção da realidade e de nós mesmos. As pessoas que as vivenciam geralmente descrevem sentimentos de grande bem-estar e de uma felicidade profunda que nunca antes tinham experimentado, o que lhes pode dar um carácter profundamente transformador.

Durante muito tempo este tipo de experiências foram classificadas como patológicas e negativas, mas hoje, são muitos os estudos que indicam que elas podem ter um papel determinante no crescimento e desenvolvimento humanos.

Geralmente ocorrem em estados de consciência alterada que podem ser fruto quer de técnicas de meditação, ou de outras técnicas espirituais ou do uso de substâncias psicoactivas, ou ainda de grandes alterações corporais, como nas experiências de quase morte, por exemplo.

Origens da Psicologia Transpessoal

O termo Transpessoal foi introduzido em 1969, nos E.U.A. com uma publicação de Stanislav Grof e de Abraham Maslow- o Journal of Transpersonal Psychology. Devido ao sucesso que esta publicação atingiu, em 1972, foi então fundada, pelos mesmos autores, a primeira associação de psicologia transpessoal, que passaria a representar a quarta força da psicologia.

Um dos marcos na história da Psicologia Transpessoal foram os estudos de Abraham Maslow, um importante teórico do movimento Humanista, que observou que muitas pessoas relatavam aquilo a que chamou de “experiências de pico”. Estas eram experiências que podiam durar apenas alguns segundos ou vários minutos e em que, quem as vivia, descrevia o dissolver das barreiras do seu Ego, com a noção de integração num todo coerente e harmonioso e um grande sentimento de bem-estar, quase de euforia. Eram experiências que tinham sempre um significado muito forte na vida das pessoas que passavam por elas, chegando mesmo a provocar grandes alterações nas suas formas de ver e de estar no mundo.

Maslow, que antes tinha já contribuido significativamente para as teorias da personalidade, com a sua célebre pirâmide das necessidades (em que postulava que o homem tinha uma certa hierarquia de necessidades que deviam ser progressivamente satisfeitas para que este se pudesse sentir feliz e realizado), concluiu que a necessidade de realização espiritual era tão forte como todas as outras e que deveria estar no topo da pirâmide como a última necessidade que deveria ser tida em conta para o desenvolvimento completo do ser humano.

Bases e fundamento da Psicologia Transpessoal

O Transpessoal trouxe para o domínio da ciência e da Psicologia algo que sempre fez parte do Ser Humano e que parece ser tão antigo como o próprio homem: a espiritualidade. Esta sempre teve um papel fundamental em todas as civilizações humanas. Quer sob a forma da religiosidade instituída ou nas suas mais diversas formas é inegável o papel que a espiritualidade sempre desempenhou na história humana. E, se hoje em dia assistimos a um certo declínio das religiões instituídas, pelo menos no Ocidente, esse declínio não se reflecte em nada na busca de uma vivência espiritual. Antes pelo contrário já que parece haver, nos nossos dias, uma busca cada vez maior de todos os tipos de espiritualidades alternativas. Enquanto os outros modelos resumem esta necessidade espiritual a uma parte mais primitiva ou irracional do ser humano, a psicologia transpessoal reconhece-a como fonte de grande realização pessoal, de onde podem surgir, por exemplo, as mais elevadas criações artísticas.

Uma premissa básica da Psicologia Transpessoal é a existência de uma filosofia perene: uma base comum a todas as tradições espirituais ou religiosas da humanidade. Sendo que as diferenças que foram surgindo teriam apenas a ver com as interpretações que foram surgindo a partir dessa base original. De facto, há alguns estudos que encontram semelhanças entre cultos ou tradições espirituais de civilizações e sociedades muito diferentes e distantes entre si, o que nos leva a crer na hipótese de que tenham surgido de um mesmo fundo comum.

Uma das dificuldades da Psicologia Transpessoal passa pela incapacidade de investigar estes estados com os intrumentos correntemente usados em psicologia. Alguns autores, como Wilber, defendem mesmo que alguns estados só são passíveis de ser analisados por quem os vivencia e enquanto os vivencia, daí que muitos teóricos do transpessoal sejam eles próprios adeptos ou praticantes das mais variadas práticas transpessoais.

Há, por parte da grande maioria dos teóricos da Psicologia Transpessoal, um grande interesse pelas tradições espirituais, especialmente pelas que são originárias do Oriente. Isto acontece porque estas, desde sempre, se preocuparam com o desenvolvimento para além do Ego. As tradições orientais, na sua maioria, admitem que existem de facto estados para além do Ego, que devem ser atingidos e procurados e, para esse efeito, existem as mais variadas escolas e técnicas como as várias escolas de meditação, de yoga, de shamanismo, etc.

Assim a Psicologia Transpessoal, sem negar nenhum dos méritos das outras correntes teóricas da Psicologia, procura integrá-las, reconhecendo que cada uma destas se dirige a um nível específico do ser humano, inserindo-as numa visão mais abrangente, em que todo o potencial humano é reconhecido, explorado e valorizado.

Laura Sanches
Bibliografia:

- Walsh and Vaughan, (1993). Paths Beyond Ego. Tarcher Putnam
- Ken Wilber, (2000). Integral Psychology. Shambala
- Abraham Maslow (1993), The Farther Reaches of Human Nature. Arkana
-A.S. Dalal, (2001), A Greater Psychology: An Introduction to the Psychological Thought of Sri Aurobindo. Tarcher. Putnam.

1 comentário:

Anónimo disse...

Discussão prazeroza neste local, visões assim dignificam aos que observar neste blogue .....
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